Review: Fallout 76

Quando o mais novo jogo da série Fallout, foi anunciado como uma experiência totalmente online, imaginava-se que ele seria algo semelhante a The Elder Scrolls Online, com mecânicas distintas do restante da série, porém com uma história imersiva, cheia de possibilidades e um belo visual, como Fallout 4.

Fallout é uma série de RPGs que se passa em um mundo retro-futurista no qual os protagonistas tem que lidar com as consequências de uma guerra nuclear que devastou o planeta. Da mesma maneira que outros jogos de sua desenvolvedora, Bethesda, ela se destaca pela sua trama complexa com várias tomadas de decisão, que mudam o desenrolar da história, além do dinamismo de suas missões, que podem ser resolvidas de várias maneiras diferentes.

Logo de cara, é realmente perceptível que Fallout 76 atendeu certas expectativas. Apesar de, talvez, os proprietários de consoles não terem notado nitidamente uma grande diferença, os gráficos sofreram algumas melhorias tornando a Wasteland mais realista. Comparado com o jogo anterior, os aprimoramentos gráficos que mais demonstram esse avanço são os efeitos de luz e sombra.

Essa nova experiência é visualmente incrível, ainda quando usamos uma placa de vídeo GeForce GTX, da NVIDIA, e ajustamos todas as configurações gráficas ao máximo. Assim, quando estamos em meio a árvores, por exemplo, é possível ver cada um dos raio de sol, como se eles fossem independentes uns dos outros.

Reclamando a mediocridade

Diferente dos demais jogos, aqui seu personagem não terá que salvar seu pai, filho ou qualquer familiar. Desta vez seu objetivo é menos pessoal, porém ainda mais nobre. Você é um dos ocupantes do Vault 76, uma entre 500 pessoas selecionadas, todos bem sucedidos e dotados de personalidades competitivas.
As portas de seu refúgio se abriram em 23 de Outubro de 2102, vinte e cinco anos após a Grande Guerra e vinte anos depois da data programada, em um evento bastante celebrado, conhecido como Dia da Retomada. Agora, longe das amenidades do Vault, com apenas alguns equipamentos e as ordens da supervisora em mãos, você terá que conquistar o mundo exterior.
Uma das principais características desse novo cenário é a quase inexistência de NPCs humanoides e consequentemente dos habitantes das excêntricas e divertidas micro-sociedades, as pequenas vilas e cidades que são uma das coisas mais memoráveis da franquia. Os únicos personagens dotados de inteligência que você encontra pelo caminho são robôs, assim a trama tem que ser descoberta pelo próprio jogador através escritos, computadores e holodiscos.

Essa situação faz com que o tempo todo você tenha a sensação de estar apenas seguindo pistas de algo que ocorreu em um passado distante, algo do qual não seu personagem faz e nem poderá fazer parte. Não importa como você conclua as quests, as suas ações não tem nenhum impacto real naquelas histórias nem exercem qualquer mudança visível naquele mundo. Você se sente como estivesse assistindo a um programa do History ou Discovery Channel, em outras palavras, você revive fatos, mas não se sente participando deles.
No final das contas, você é só mais um entre centenas das pessoas que tentam salvar um mundo que não existe mais, onde todas as pessoas com que seu personagem importava estão mortas e não há ninguém para ocupar o vazio que essas deixaram. Enfim, não há nada que lhe faça realmente agregar valor aos seus feitos e realmente lhe dê motivos para continuar.
Para piorar a situação, as tomadas de decisão e o dinamismo da quest, que são marca registrada da franquia, foram simplesmente colocadas de lado, trocadas por uma história linear, que possui apenas alguns objetivos opcionais, sendo que estes não influenciam no andamento da trama.

A nova velha Wasteland

Fallout 76 traz algumas poucas novidades a série como sistema de atributos e perks; C.A.M.P, além atalho para armas/itens de ajuda e algumas interações extras com as Power Armor. Todas as demais mecânicas foram herdadas de Fallout 4.
O sistema de perks agora usa cartas para distribuir seus pontos, resultando em algo mais flexível em comparação aos outros jogos da série. Na prática, cada vez que você sobe de nível você seleciona qual dos atributos quer aumentar e em certos níveis ganha um pacote especial com quatro cartas distintas, que representam os Perks.
Essas cartas, por sua vez, podem ser associadas a um dos atributos.  No final das contas, seu sistema de perks lembra o jogo Paciência e você pode mudar as cartas ativas sempre que quiser.
Lembrando que a partir de amanhã (11/12) mesmo a escolha de atributo não será algo definitivo. Depois do nível 50, é possível escolher entre uma nova carta ou trocar um ponto que tinha sido atribuído previamente a outro Atributo.
Até então, nos jogos de Fallout, uma vez escolhidos, atributos e perks nunca mais poderiam ser alterados.
Além dos gráficos, talvez esse novo sistema tenha sido a única contribuição positiva que Fallout 76 trouxe a série.

Mecânicas de crafting ainda existem e na verdade, deveriam ser um dos maiores focos do jogo, mas ao contrário de Fallout 4, com exceção de construção, reparo de equipamentos e da preparação alimentação, em nenhum momento você é ensinado ou incentivado a construir seu própria casa. Isso mesmo, não há tutoriais ou quest focados nesse aspecto do jogo, apesar do mesmo estar presente.
Se, no entanto, você insistir nesse empreendimento e erguer as paredes do seu doce lar, terá que encontrar uma maneira de contornar alguns entraves como o stash limitado.
Em Fallout tudo é construído a partir de sucata encontradas durante sua jornada pelo mundo. Desde de armas e equipamento até casas e mobília, as coisas a sua volta são composta de lixo encontrada na Wasteland.
O problema é que, enquanto no título anterior é possível acumular itens e sucata a vontade, em Fallout 76 o limite é de 600 kg, o que é muito pouco quando o assunto é um refúgio e gurdar armas e armaduras.

Só para que se tenha uma noção, há armas que pesam até 20 kg como é o caso do lanças mísseis e cada parte da armadura pesa em média 5 kg, isso sem levar em consideração os materiais necessários para construir sua casa, ou seja, 600 é número muito pequeno para dar conta de tantas necessidades.
A Bethesda, por sua vez, alega que liberar o acúmulo de sucata pode afetar negativamente o equilíbrio do jogo. Todavia, apesar de até agora só termos a comercialização de itens estéticos usando dinheiro real, suspeito que a resposta da empresa a essa necessidade dos jogadores virá em formato de microtransações.

A guerra nunca muda, independente dos pacifistas

Como todo o bom RPG online, Fallout não estaria completo sem o PVP. Apesar disso, não há de fato um modo de jogo específico ou uma arena em separado, onde os jogadores possam colocar isso em prática. Na verdade, para essa finalidade a Bethesda parece ter se inspirado nos jogos da série Bordelands, no qual basta que os jogadores golpeiem um ao outro uma única vez para que a disputa seja iniciada, porém ao contrário do jogo da Gear Box, o duelo ocorrerá independente do consentimento de qualquer um dos participantes. Em contrapartida, quem matar outro jogador ganhará o título de procurado, ficará visível a todos os outros jogadores do servidor, que receberão uma recompensa caso consigam tirar sua vida.
O ruim disso é que essas batalhas, geralmente, são provocadas por jogadores de nível elevado que vão para as áreas iniciais do mapa propositalmente com a intenção de matar novatos, jogadores que muitas vezes nunca tiveram contato com a série e ainda estão aprendendo as mecânicas do jogo. Além disso, mesmo que esse assassino ganhe o status de Procurado, ninguém nas redondezas dará conta de derrotá-lo, logo você fica dependendo dos poucos jogadores de nível alto, que geralmente estão distantes, isolados nos extremos do mapa. Em outras palavras, ao contrário de outros jogos online, aqui o PVP não é opcional e tem um péssimo balanceamento.

Evitando um novo apocalipse

Se dentro do seu gênero RPG Online, compararmos Fallout 76 a outros títulos, ele está longe de ser considerado ruim. No entanto, quando o colocamos ao lado de outros jogos de sua série, é possível perceber claramente o quanto ele se distanciou, no pior sentido da palavra. É claro que não seria possível transportar a mesma experiência singler-player a um multiplayer, porém não há desculpa para o quão linear e simples são sua trama e missões.

Talvez, nosso console seja que, pelo menos, Fallout 76 e toda a controvérsia que o rodeia, possam servir de exemplo tanto para indústria quanto para os fãs que tanto o requisitaram um game multiplayer da fraqnuia, mostrando que certas experiências são tão únicas e singulares, que é impossível convertê-las sem sacrificar muito de sua essência, daquilo que lhe faz um jogo tão especial.
* Este texto foi produzido a partir de uma chave cedida por terceiros.

Manoel Siqueira

é formado História, Filosofia e cursa Pós no Uso de Jogos e Brincadeiras em Sala de Aula. Também é redator, podcaster e editor no site http://meialua.net @meialuafsoco.