A franquia 007 dispensa apresentações, mas farei assim mesmo.
Criada por Ian Flemming em 1952 esta série de livros está na lista das mais vendidas de todos os tempos e alçou um voo mais alto quando foi adaptado para o cinema, contando com com as interpretações carísmáticas de Sean Connery e Roger Moore.
As estórias de espionagem protagonizadas por James Bond tratavam de um mundo pós Segunda Guerra na qual as disputas entre capitalismo e socialismo começavam a despontar e a Guerra Fria já dava sinais de vida.
Em 2008 resolveram dar vida nova para a franquia e fizeram um reboot completo em Cassino Royale, trazendo um ator bastante diferente dos que anteriormente interpretaram Bond e aplicando visual e um roteiro com estilos igualmente diversos.
Daniel Craig foi escalado para interpretar um James mais bruto, recém incluído ao programa 00 da Inteligência Britânica e que não se encaixava tão bem ao perfil dos demais agentes do governo.
Lembro de discutir a escolha dele algumas vezes e não estava muito claro, para mim, que se tratava de um reboot ou se 007 e James Bond seriam apenas códigos.
Isso ficou claro com Skyfall, que ao meu ver, costurou as diversas referências feitas nos dois filmes anteriores e neste e encerrou a trilogia fazendo uma ligação clara com todo o universo criado nos filmes anteriores.
Em 007 Contra SPECTRE, James continua sua jornada em busca de respostas e vingança, perseguindo criminosos sem autorização do MI6 e causando grandes danos colaterais nessas tentativas.
M (Ralph Fiennes) é pressionado pelo governo e pelo chefe da Joint Intelligence Service (formada na junção do MI5 e MI6), cujo codinome é C (Andrew Scott), a extinguir o Programa 00 e por conta dos estragos causados por Bond, coloca-o sob vigilância constante utilizando para isso um novíssimo sistema de rastreamento criado por Q (Ben Whishaw).
Bond obviamente desobedece as ordens de M e vai para Roma para continuar sua busca pela organização SPECTRE e assim seguimos nele nesta aventura que faz seqüência direta a Skyfall e que encerra o ciclo de Daniel Craig no papel do espião mais famoso do mundo.
As diversas ligações deste filme com os três anteriores é óbvia e reforçada diversas vezes durante o filme e o roteiro é bastante competente em amarrá-las, mas é até este ponto que podemos elogiá-lo, pois há diversas outras amarrações criadas para justificar a evolução da trama e reestabelecer o universo dos demais vinte filmes da série que deixam muito a desejar.
O enfoque claro de trazer de volta toda a aura dos antigos filmes de 007 é tão forte que até mesmo os erros e desleixos são reproduzidos em SPECTRE e isso pode ser bastante frustrante para uma parte do público que abraçou o reboot feito em Casino Royale e completado de forma magistral em Skyfall.
Em contrapartida, este enfoque trará para os fãs da série antiga uma sensação boa de nostalgia e provavelmente vibrará com as diversas referências e também com o vilão.
Gostaria de parabenizar a lindíssima sequência de abertura. Seu início é filmado em um plano sequencia incrível e de grande dificuldade e culmina com a explosão de uma bomba e uma perseguição em meio ao festival. É de tirar o fôlego.
Após essa cena temos a famosa abertura, com a música tema do filme. As imagens trazem muitas referências aos três filmes da era Craig e utiliza diversos polvos e tentáculos para simbolizar a SPECTRE. Uma abertura interessante com uma música boa que remete aos temas clássico, mas que escorrega quando Sam Smith insiste em falsetes.
Este início mantém a linguagem e estilo dos anteriores, mas basta voltarmos da música tema que começamos a receber os sinais de que haveria muitas mudanças.
Os dois sinais mais claros dessa mudança, ainda no primeiro ato do filme, são o encontro de James com o vilão em uma sala de reunião grandiosa e coberta por sombras no rosto dele e nesta mesma cena somos apresentados ao capanga principal, uma espécie de Jaws, mas com unhas de metal (Dave Bautista) e bastante caricato.
Nota: A cena de apresentação deste vilão, cravando as unhas prateadas de seus polegares nos olhos de um comparsa até matá-lo fez boa referência ao costume dos gregos antigos de colocar moedas de prata sobre os olhos dos mortos para que pagassem o barqueiro Caronte para levar suas almas em segurança pelo Estige até o submundo do deus Hades.
O outro sinal é na cena que James vai encontrar a viúva (Monica Bellucci) de Sciarra (vilão que ele persegue e mata na cena de abertura, vivido por Alessandro Cremona). Eles tem um encontro no funeral e um quando ele vai até a mansão dela. Neste segundo temos uma cena clássica, rápida e rasa de sedução de Bond e eles vão pra cama.
Ambas cenas mostram um retorno à linguagem tradicional dos filmes de 007, com boas doses de caricatura nos vilões, mulheres com pouca ou nenhuma personalidade e, claro, machismo.
Enquanto Cassino Royale, Quantum of Solace e Skyfall trouxeram para franquia diversidade e inclusão (até certo ponto, claro) utilizando a fantástica Judi Dench como M, bond-girls com personalidade e posicionamentos definidos e ao final uma Moneypenny (Naomie Harris) negra, SPECTRE deixa tudo isso de lado para trazer a franquia de volta para onde Pierce Brosnan deixou em Um Novo Dia Para Morrer.
Podemos criticar essa decisão e dificilmente conseguiremos justificá-la a contento, tanto quanto é complicado dizer que fizeram a escolha errada, já que o personagem foi criado desta forma por Flemming há tantas décadas e muitos dos clichês utilizados neste novo filme estão alí por também terem sido definidos nos 20 filmes que antecederam a era Craig.
Para finalizar, há um item que mesmo para um fã deve ter incomodado bastante: o romance de Bond e Madaleine Swan (Léa Seydoux). Esse romance não funciona, os dois não tem química em cena e tudo parece muito forçado e falso e poderia ter sido muito melhor trabalhado.
Tendo em mente que o filme traz o James Bond clássico de volta, fica muito fácil para os fãs da franquia acharem o filme excelente, pois ele tem tudo que eles reclamaram ao ver Cassino Royale.
Eu, particularmente achei o filme muito bom, mantém a aura dos filmes anteriores amarrando bem todos eles e fazendo grandes referências aos clássicos.
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